13 de fevereiro de 2010

Criando Deuses - Parte V (Final)



Definida a condição dos deuses, origem e a organização do Panteão, chegou a hora de defini-los propriamente. A essa altura, o Mestre muito provavelmente já deve ter algumas idéias a respeito dos deuses que deseja em seu cenário, as dicas a seguir visam auxiliar na construção das características básicas do deus, seu elemento essencial de inclusão na campanha. A relevância das divindades no cenário de fantasia será abordada em artigos futuros; temos aqui apenas uma visão breve a respeito dos deuses da fantasia e como elaborá-los de maneira interessante em um cenário fantástico de RPG.


O PODER VEM DO DOMÍNIO

Iremos utilizar a terminologia “domínio” para representar os campos de influência de um deus sobre o mundo. O domínio é o primeiro ponto de definição a respeito de um deus, e pode estar relacionado a qualquer aspecto do mundo. É importante notar que os aspectos primordiais têm mais chances de estarem relacionados a uma divindade, principalmente em um cenário com poucos deuses.

Domínios primordiais regem as questões essenciais do mundo: vida, morte, os elementos (onde você pode optar por uma definição clássica, ou criar a sua própria!); e conceitos básicos, como guerra, conhecimento ou magia. Que domínios serão realmente primordiais é uma escolha pessoal, bastante subjetiva, e que diz muito a respeito do foco que você deseja dar ao cenário.

Quanto menos deuses, maior a concentração de domínios em cada divindade. Um Panteão maior pode levar à pulverização dos domínios primordiais, mesmo quebrando-os em vários aspectos. Além disso, aumentam também as esferas de influência menos significativas de modo geral. Essa amplitude de domínios não é obrigatória; é possível termos um cenário com um grande número de deuses regendo aspectos semelhantes ou até mesmo iguais, diferenciando-se entre si apenas por inclinações morais e éticas ou cultura.

É mais esperado, porém que um cenário com uma grande profusão de divindades permita a existência de domínios de menor prioridade. A definição é difícil, visto que cada cenário possui um foco específico que pode mudar essa prioridade. Um bom ponto de partida é pensar em um domínio de grande abrangência, e então procurar o que está incluso dentro dele. Assim, vejamos, por exemplo, a esfera de influência sobre a morte: em um cenário com poucos deuses e pequena divisão de domínios, o deus da morte irá regular o momento da passagem dos mortais para o mundo dos mortos, irá reger os mortos-vivos, e também os reinos que os mortais habitarão na além vida. Ainda sim, este não é o único fator de personalização das divindades. Quanto maior a divisão dos domínios, maior é a possibilidade de combinação entre eles, dando origem a deuses mais diversificados.


DE QUE LADO ELE ESTÁ?

As inclinações éticas e morais de um deus também compõem um aspecto de relevância fundamental na sua construção. Na fantasia clássica, os eixos mais utilizados são bem X mal e ordem X caos. A escolha de qual dos dois eixos irá influenciar os seus deuses muito provavelmente já terá sido feita, estando, de fato, intrínseca a definição do cenário. Se um dos pontos principais do seu cenário fantástico é a batalha entre as forças da ordem e do caos, este será o eixo utilizado. Note-se que é possível a combinação de ambos os eixos, auxiliando ainda a personalização de cada divindade.

A definição do alinhamento de um deus é interessante por delinear a forma como irá se relacionar com suas esferas de influência. Um deus do fogo de alinhamento benigno pode representar o aspecto purificador das chamas; um deus do fogo de aspecto maligno pode representar a morte e a destruição causada pelo fogo. De fato, é possível atingirmos níveis maiores de complexidade com as sombras de cinza possíveis dentro dos eixos, especialmente ao trabalharmos com domínios mais conceituais, como guerra, conhecimento, e magia.


E COM QUEM?

Outro aspecto relativo à esfera de influência dos deuses é a relação que cultivarão com seus seguidores. Considerando que os eixos de alinhamentos influem diretamente sobre as culturas de um cenário, sociedades ordeiras terão preferência por deuses da ordem; sociedades caóticas, por deuses do caos. O medo, porém, pode alterar esse padrão, levando um deus maligno a reinar supremo em terras cujos habitantes são bondosos, porque seus representantes estabeleceram o reinado do terror.

O último aspecto de relevância em relação à criação de um deus é a sua relação com as sociedades do cenário fantástico. Um único deus pode ser reverenciado em várias culturas, apresentando aspectos físicos diferentes, mas dominando as mesmas esferas de influência. É comum, porém que cada cultura do cenário, e mais especificamente, cada raça, apresente divindades características, as raças não-humanas apresentam divindades patronas, com as características mais marcantes da raça como principais domínios.

É possível que essa divindade seja, na verdade, parte de um Panteão particular; em muitos cenários fantásticos populares, os deuses do Panteão são os deuses dos humanos, e as outras raças possuem seus próprios Panteões. Uma pergunta importante a ser feita pelo Mestre, nesse aspecto, é a relação entre a existência dos deuses e seus adoradores: se os deuses existem apenas devido à crença de seus fiéis, reflexos no mundo dos mortais possuem crucial relevância no status da divindade (assim, a aniquilação dos anões por invasores gigantes muito provavelmente representará a morte, ou o grande enfraquecimento dos deuses anões). Caso eles existam separados da crença, sendo divindades por si só, e utilizando seus seguidores apenas como possibilidades de ação no mundo mortal, o contrário se torna o comum: a destruição da deusa dos elfos por outros deuses tem como relevância na decadência da raça élfica.

Um meio termo também pode ser obtido nesse aspecto, considerando que a crença é fundamental para a existência dos deuses: conflitos em um Panteão podem ter severos reflexos nas sociedades mortais, embora não sejam, necessariamente, decisivos. De fato, esses momentos podem representar o surgimento de novos deuses, ou a expansão de influência de deuses já existentes.


CONCLUINDO

Bem, com tudo isso, espero que você consiga desenvolver melhor essa face importante do seu cenário de fantasia elevando assim sua campanha a um novo nível. Existem muitas outras coisas interessantes a serem ditas sobre as divindades. Espero que abordando um tema que, embora seja interessante, continua indo na contramão do que muitos esperam de um cenário de fantasia. Falamos bastante sobre as concepções divinas, mas não é tudo! E precisamos juntar todas as pontas soltas do seu Panteão, e só assim torná-lo um fator marcante na sua campanha. As idéias aqui apresentadas são poucas se comparadas aos inúmeros aspectos que ainda podem ser abordados nesse tema, mas espero que sejam úteis para vocês e que possam ajudá-los no desenvolvimento de seus próprios cenários de jogo.

Bem, aqui termino nossa pequena, mas produtiva discussão sobre a criação de Panteões em cenários de fantasia. Espero que as dicas ajudem no desenvolvimento das divindades de seu cenário, e quem vocês estejam satisfeitos, e coloquem todos esses deuses pra trabalhar de verdade!


Autor: José Kleibe Souza Silva (acadêmico de pedagogia - UFPA), Altamira - PA.


BIBLIOGRAFIA


  • CASSARO, Marcelo – Tormenta: O Panteão / Marcelo Cassaro, Rogerio Saladino, J. M. Trevisan; arte de Erica Awano [et al.]; revisão Guilherme Dei Svaldi; Porto Alegre: JAMBÔ, 2006.;

  • Forgotten Realms Reinos de Ferro;

  • Greenwood, Reynolds, Williams e Heinosoo;

  • Crônicas de Dragonlance;

  • Storyteller – Anjo: A Salvação;

  • Storyteller – Demônio: O Preço do Poder;

  • CORDELL, Bruce R.; Dungeons & Dragons Linhagens e Tomos: Um livro de referência para magos e feiticeiros / Bruce R. Cordell, Skip Williams; Ilustrações Todd Lockwood, Denis Cramer. Tradução: Bruno Cobbi da Silva – São Paulo, Devir, 2003;

  • REDMAN, Rich; WILLIAMS, Skip; WYATT, James; Dungeons & Dragons – Divindades e Semideuses; Rich Redman, Skip Williams e James Wyatt. Tradução: João Marcelo Alex Boni – São Paulo, Devir, 2004;

  • COOK, Monte; Dungeons & Dragons: Livro de Mestre: Livro de regras básicas II: V 3.5 / Monte Cook... [et al.]; Ilustrações Vários. Tradução: Marcelo de Souza Stefani, João Marcelo Alex Boni e Bruno Cobbi da Silva – São Paulo, Devir, 2004;

  • COLLINS, Andy; CORDELL, Bruce R.; Dungeons & Dragons – Livro dos Níveis Épicos; Andy Collins e Bruce R. Cordell. Tradução: Bruno Cobbi da Silva, Clarise Yusa Yamasaki, João Marcelo Alex Boni e Marcelo de Souza Stefani – São Paulo, Devir, 2005;

  • GRUBB, Jeff; CORDELL, Bruce R.; NOONAN, David; Dungeons & Dragons – Manual dos Planos; Jeff Grubb, Bruce R. Cordell e David Noonan. Tradução: João Marcelo Alex Boni – São Paulo, Devir, 2005;

  • NOONAN, David; Dungeons & Dragons – Livro completo do divino: Um manual sobre magia divina para personagens de todas as classes; David Noonan. Tradução: João Marcelo Alex Boni – São Paulo, Devir, 2006.

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Nós do RPG Pará gostariamos de agradecer ao Kleibe por ter mais uma vez participado do quadro Colaborador Eventual do RPG Pará. Aqueles que também estiverem interessados em participar desse espaço e publicar suas idéias e outras coisas mais sobre RPG, deverão seguir as orientações no seguinte link: Colaborador Eventual do RPG Pará.

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